A lesão do ligamento cruzado anterior pode acontecer em indivíduos durante atividades do cotidiano, ou, mais frequentemente, durante a prática de atividades esportivas, com gestos que envolvam mudança de direção ou de giro sobre o corpo. Geralmente este tipo de entorse do joelho vem associado a um estalido (que muitas vezes é escutado pelo paciente e por quem está ao seu redor), gerando uma dor intensa no joelho e inchaço articular (derrame), seguido de incapacidade de retornar à atividade esportiva logo após o episódio (Figura 1).
Após a fase aguda, a tendência é que a dor passe a regredir, sendo os principais sintomas relatados pelos pacientes o falseio do joelho, ou a falta de segurança para se apoiar na perna lesionada, seja para as atividades do dia a dia, seja para a prática esportiva. Isto acontece porque o ligamento cruzado anterior é o principal responsável por evitar que aconteça o deslizamento “para frente” do joelho. Este ligamento conecta o principal osso da perna (tíbia) ao osso da coxa (fêmur) (Figura 2).
(Figura 1)
(Figura 2)
A decisão quanto ao tratamento vai levar em conta diversos fatores individuais, como a sintomatologia do paciente, qual o seu grau de demanda e estilo de vida, e também a presença de lesões associadas que necessitem ser tratadas de maneira cirúrgica.
É possível, para um pequeno grupo de pacientes, obter sucesso tratando a lesão do ligamento cruzado anterior sem cirurgia, a depender de sua demanda, de certas características individuais e da ausência de outras lesões associadas. Nestes casos, é fundamental a avaliação multidisciplinar e seguimento dos protocolos propostos pela equipe de Fisioterapia e Ortopedia.
Mas por acometer com frequência pessoas com alta demanda, poder apresentar com lesões associadas identificadas por meio do exame físico ou por exames complementares (como as lesões de menisco, lesões de outros ligamentos, ou ainda lesões de cartilagem), para a grande maioria dos pacientes o tratamento cirúrgico proporciona melhores resultados.
A cirurgia do ligamento cruzado anterior é realizada com o objetivo de reconstruir o ligamento que sofreu a ruptura. Para isto, são utilizados enxertos, que são tecidos do organismo com características parecidas ao ligamento original – geralmente retirados do próprio paciente. Os principais enxertos utilizados são: os tendões dos músculos grácil e semitendíneo, a porção central do tendão patelar e a porção central do tendão do quadríceps (Figura 3).
Além do acesso cirúrgico utilizado para retirar o enxerto escolhido, são feitas duas pequenas incisões para acessar o joelho por artroscopia (Figura 4): por um desses dois cortes, introduzimos uma câmera de menos de 5 milímetros no joelho para poder visualizar a articulação e realizar a cirurgia. Pelo segundo corte, utilizamos os instrumentos que serão responsáveis pelas demais etapas do procedimento de reconstrução do ligamento.
A cirurgia tem o objetivo de “cavar” um túnel no osso da coxa e um outro túnel no maior osso da perna, justamente no posicionamento original do ligamento cruzado anterior. Após reproduzir essas duas localizações, o cirurgião posiciona o enxerto que foi retirado e preparado previamente dentro dos túneis recém-feitos, de modo que ele assume a mesma orientação “cruzada” do ligamento original.
(Figura 3)
(Figura 4)
(Figura 5)
A parte final da cirurgia consiste em segurar o “novo” ligamento com parafuso ou ainda com outros dispositivos de fixação no osso (Figura 5), aplicados nos ossos do fêmur (coxa) e tíbia (perna), até que o enxerto colocado cicatrize. De modo geral, é um procedimento que demora em torno de uma hora, e o paciente pode receber alta hospitalar no mesmo dia, ou então no dia seguinte.
Já após a recuperação da anestesia, iniciamos os exercícios para a reabilitação. De rotina, apenas nos primeiros dias se costuma utilizar muletas, estando o paciente liberado para pisar com a perna operada com o uso de um imobilizador. A reabilitação é individualizada, a depender também se houver a necessidade de procedimentos adicionais à reconstrução do ligamento cruzado. Sempre aliado à Fisioterapia, a recuperação pós-operatória e retorno às atividades esportivas é um processo que costuma durar cerca de oito a nove meses, apesar da introdução de exercícios com bicicleta, academia, corrida e exercícios voltados ao esporte praticado ocorrerem gradualmente.
Dr. Pedro Galvão
Médico Ortopedista
CRM-PR 35.375
RQE 27.205